sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Entabulando conversações

Minha mãe, que Deus a tenha, era expert em iniciar conversações com qualquer pessoa. Era uma pessoa humilde, estudou pouco, o ginasial incompleto, mas tinha uma grande vivência, que é o mais importante. Lembro quando minha irmã me contou que minha mãe estava na rodoviária e viu uma moça chorando. Minha mãe sentou-se ao lado da moça, arrancou a história: a moça perdeu o dinheiro e a passagem e não sabia mais como iria embora. Considerando a história verdadeira (não foi a moça que abordou minha mãe e sim o inverso), minha mãe falou com a moça para não desanimar. E minha mãe e a moça saíram pela rodoviária contando o ocorrido e pedindo dinheiro para a moça voltar para a cidade dela. E conseguiram. Minha mãe acompanhou a moça até o embarque no ônibus. Minha mãe não fazia alarde da história, contava como coisa banal, sempre nos ensinou que deveríamos ajudar o próximo, sem qualquer preconceito.
Conto este fato porque li no Hoje em Dia, que os recenseadores do IBGE têm uma grande dificuldade de entrevistar as pessoas da classe alta. Os ricos alegam que não têm tempo ou desconfiam do recenseador. As demais classes não têm este problema. Recebem o recenseador com todo o prazer.
Quando uma moça do IBGE esteve em nossa casa, na época em que morávamos em Contagem, nos anos 80, eu lembro que minha mãe levou a moça para a sala, deu água, café e respondeu tudo na maior boa vontade. A recenseadora perguntou se eu estava desempregado, eram umas 14 h, e eu respondi direto a ela, que meu horário estava atípico no mês; eu estava pegando serviço às 17:30 h. Ela ficou espantada de saber que eu era surdo, porque eu também estava conversando normalmente com ela. E, rindo de minha mãe, que fez o “censo da recenseadora”, perguntado onde a moça morava, a família, irmãos; minha mãe perguntou mais do que a moça fez anotações nos formulários. Normalmente, as pessoas mais simples não têm medo de abrir as portas e informar todos os dados, servir um cafezinho, água, biscoitos. Eu gostava muito desta característica de minha mãe, a possibilidade de entabular uma conversação assim sem mais nem menos. Eu não tenho como fazer a mesma coisa, devido à surdez, que causa uma barreira, às vezes intransponível, na comunicação.
(Minha mãe faleceu há quatro anos, deixando-nos bons exemplos e boas histórias para contar)

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Os comentários não passam por aprovação, mas serão apagados caso contenham termos ofensivos, palavrões, preconceitos, spam. Seja coerente ao comentar.